Limpando a área
Quando a casa está entulhada de coisas, é hora de parar e pensar no que pode ser doado: desapegar é de lei
por Chantal Brissac
Mas existem fases em que entramos pela porta de casa e a visão que se tem não é lá muito agradável. Coisas entulhadas sem serventia, acúmulo de papéis, peças que estão na prateleira há anos sem ser tocadas, livros que nem sequer foram abertos, roupas que nunca foram usadas. É o caso de questionar: será que perdemos a liga com a moradia ou é o nosso interior que anda meio perturbado? Podem ser as duas coisas, ou apenas uma delas, mas o importante é arregaçar as mangas e começar a agir. E saiba que boa parte do trabalho será feita em você: a faxina começa de dentro para fora. Não adianta empilhar mil e um objetos para doação se daqui a um mês uma nova e incrível leva estiver atravancando outra vez o seu ambiente.O ciclo das coisas Comece devagar, pensando em cada item que você não usa e, portanto, não merece ficar ali parado, sem ser aproveitado. Tenha perto um saco ou uma caixa grande, de papelão, para ir colocando as peças que serão doadas. Lia Diskin, co-fundadora do centro de estudos filosóficos Palas Athena, lembra de um ciclo que costumamos subestimar: “Cada objeto tem sua trajetória e sua utilidade. Que direito temos de imobilizar todo esforço da natureza, da criatividade humana e da tecnologia para guardar uma coisa sem usá-la?” Assim, o sapato esquecido no armário teve, em seu ciclo, o couro do boi, que foi alimentado no pasto, molhado com a água da chuva. O livro fechado também passou por várias mãos antes de chegar à sua. Antes disso, veio da árvore, nutrida pelo solo e pelo sol. Quando alguém deixa um objeto sem uso, interrompe sua história natural.Ah, mas e o prazer de guardar, de colecionar? Como ficam as coleções de ursinhos de pelúcia, curtidas desde a infância, os discos de vinil, as latinhas de cerveja garimpadas em cada canto do mundo, os pingüins da geladeira? Bom, isso já é um caso de paixão, de gosto pessoal, departamento em que não se toca sem permissão. Se essas coleções são vivas e não estão esquecidas, pode ser legal ficar mais um tempo com elas.Mas até isso pede análise. Será que uma coletânea de discos teria melhor continuidade em um museu, onde várias pessoas poderiam ouvir as músicas? Você já pensou em reduzir sua coleção de preciosidades para um número mais sensato, e que sua casa pode abrigar? Só você pode responder.Algumas pessoas encontraram jeitos particulares de lidar com o excesso. Lia Diskin, de novo, é exemplo. Tudo o que ela não movimenta num período de dois anos é doado. Podem ser livros, roupas, CDs, objetos de decoração, o que for. Sua biblioteca pessoal, hoje, não ultrapassa os 500 volumes. Para Lia, que possui meia dúzia de pares de sapatos – “Não preciso mais, só tenho dois pés” -, essas cinco centenas de livros são aquelas chamadas imprescindíveis, que ela está sempre a folhear e pesquisar.Segundo o químico Flávio Maron Vichi, professor do Instituto de Química da USP, dois anos é realmente o tempo-limite para um livro sobreviver sem estragos. “Depois disso, ele começa a se e ganhar manchas, resultado da falta de oxigênio”, diz. Outros objetos, como CDs, quadros e fotos, também precisam ser arejados constantemente. Além da limpeza, necessitam de ventilação, fundamental para evitar fungos. Portanto, faz todo sentido passar as coisas adiante se num determinado período – você pode adotar a política dos dois anos ou criar um prazo-limite só seu – não precisou delas para nada.
Loucas por sapatos