Fernando Pessoa
Começa a ir ser dia,
O céu negro
começa,
Numa menor negrura
Da sua noite escura,
A Ter uma cor fria
Onde a
negrura cessa.
O céu negro
começa,
Numa menor negrura
Da sua noite escura,
A Ter uma cor fria
Onde a
negrura cessa.
Um negro azul-cinzento
Emerge
vagamente
De onde o oriente dorme
Seu tardo sono informe,
E há um frio sem
vento
Que se ouve e mal se sente.
Emerge
vagamente
De onde o oriente dorme
Seu tardo sono informe,
E há um frio sem
vento
Que se ouve e mal se sente.
Mas eu, o mal-dormido,
Não sinto
noite ou frio,
Nem sinto vir o dia
Da solidão vazia.
Só sinto o indefinido
Do
coração vazio.
Não sinto
noite ou frio,
Nem sinto vir o dia
Da solidão vazia.
Só sinto o indefinido
Do
coração vazio.
Em vão o dia chega
Quem não
dorme, a quem
Não tem que ter razão
Dentro do coração,
Que quando vive nega
E
quando ama não tem.
Quem não
dorme, a quem
Não tem que ter razão
Dentro do coração,
Que quando vive nega
E
quando ama não tem.
Em vão, em vão, e o céu
Azula-se
de verde
Acinzentadamente.
Que é isto que a minha alma sente ?
Nem isto, não,
nem eu,
Na noite que se perde.
Azula-se
de verde
Acinzentadamente.
Que é isto que a minha alma sente ?
Nem isto, não,
nem eu,
Na noite que se perde.